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terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Moradores não querem abandonar terras para Eikelândia



Maioria é a favor das obras de Eike Batista, mas não quer deixar de ganhar com desenvolvimento da região

André Vieira, enviado especial a São João da Barra

Durval Alvarenga, agricultor: "Não acredito que eles vão usar toda essa área"


O produtor rural Durval Alvarenga, de 56 anos, está agachado ao lado da estrada de terra, selecionando abacaxis de sua plantação. É a última safra do ano de 2010, a melhor da região, que deve colher 60 milhões de frutas, 25% a mais do que a safra passada. Alvarenga faz uma breve pausa e responde, apressadamente, à pergunta sobre os impactos dos empreendimentos ligados às atividades do Superporto de Açu na zona rural de São João da Barra (RJ): “É a derrota”, diz, em um tom melancólico.

Alvarenga não quer deixar sua terra para trás – área que vem sendo pleiteada para acomodar as indústrias planejadas pelo empresário bilionário Eike Batista. O agricultor é dono de três propriedades, que somam 4,5 alqueires e, além do abacaxi, planta cana, abóbora, maxixe. “Não acredito que eles vão usar toda essa terra para a indústria.”



A notícia de desapropriação de parte da região do Açu, no 5º Distrito de São João da Barra, deixa muitos moradores da área rural inquietos e desconfiados. É hora de sair. Vamos ficar. A lei mudou. A lei foi revogada. A maioria dos moradores ouvidos pelo iG não sabe o que fazer sobre o destino de suas terras, aguardando informações mais precisas.


Solo arenoso

A região do Açu tem menos de 10% da população de São João da Barra, mas responde por 50% da área do município. O terreno é bastante arenoso, para poucas espécies. As casas são modestas.


Quando chegou ao Açu há uns cinco anos para procurar terras para seus projetos, o empresário Eike Batista adquiriu duas fazendas: a Saco Dantas e a Caroara. O empresário não titubeou: pagou R$ 14 mil por alqueire, que naquela região mede 48 mil metros quadrados. O valor era o dobro da cotação de mercado na época, segundo fontes ligadas à prefeitura.


Na primeira fazenda, Eike decidiu localizar as operações portuárias, incluindo também a atividade de mineração, termelétrica e afins. Na outra, o objetivo era instalar o distrito industrial para acomodar os demais empreendimentos como a montadora, as siderúrgicas, as cimenteiras.



Mas, ao fazer o licenciamento da área, o órgão ambiental do Estado do Rio avaliou a segunda propriedade como unidade de conservação ambiental pela proximidade das lagoas da região – uma forma que os técnicos ambientais tomaram também para preservar a área diante dos impactos a serem gerados pelo empreendimento. Ao todo, a área, de restinga, equivale a 5,5 mil hectares. A ideia do órgão ambiental é criar uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), a maior do Estado do Rio.

Impedidas de se instalarem como queriam, as empresas do grupo EBX foram procurar outra área no Açu onde moram hoje cerca de 3 mil pessoas. Segundo a prefeitura, há 370 proprietários de terras.

Estrada asfaltada


Depois que correram os rumores sobre os empreendimentos de Eike Batista, as terras do Açu já valorizaram. Ninguém gosta de falar quanto. Mas há notícias de que os valores teriam chegado a R$ 60 mil por alqueire, gerando uma frenética especulação imobiliária.

Com a obra do Superporto em ação desde 2007, nada parece ter mudado na área rural do Açu. A LLX ajudou na recuperação dos 25 quilômetros da RJ-240, a estrada que dá acesso ao Superporto do Açu. Assim, garantiu mais segurança para a passagem dos pesados caminhões que transportam material para o porto. Mas o asfalto da estrada que leva à zona rural acaba em um trevo.

“Não sou contra o porto nem contras as indústrias que chegarem. Mas não quero sair daqui. Quero aproveitar para crescer e ganhar dinheiro com as obras”, diz a cabeleireira Jocenete Barreto, de 22 anos. Tendo trabalhado em salão de beleza em Campos de Goytacazes, ela abriu um modesto salão do qual se orgulha e pretende aumentá-lo com o eventual progresso na região.

Com cursos como contabilidade e informática, Jocenete acredita que poderá se dar bem, cortando os cabelos dos futuros operários do complexo industrial, mas teme por seus parentes e outros moradores do Açu. “Minha família mora aqui faz 100 anos. Se tivermos de sair, para onde vamos? A maioria é pobre e não tem estudo. Vai trabalhar com o que na cidade?”, pergunta.


Dono de um pequeno supermercado com um caixa único e uma loja de móveis, Daniel Almeida, de 50 anos, não sabe se terá de sair do local onde mora e tem seus negócios. Mas faz planos de abrir um restaurante em 2011 para oferecer refeições aos novos empregados que trabalharão na região.

“Minha ideia é ganhar dinheiro a vista do pessoal que virá. Com os negócios atuais, só acumulo dívida porque todo mundo no Açu só compra fiado”, conta ele, que deve cerca de R$ 50 mil a fornecedores.

Além do dinheiro da desapropriação, a prefeitura sugere o reacomodação dos moradores para nova área do município, mais longe do empreendimento, do centro da cidade e do mar. As terras aparentemente parecem mais apropriadas para a agricultura do que as do Açu. “Estamos oferecendo a eles a possibilidade de assentamento numa agrovila”, diz a prefeita Carla Machado.

No pacote oferecido pela prefeitura aos moradores com posse ou domínio de dois a 10 hectares de terras que serão desapropriadas, a promessa é conceder uma casa nova em ruas asfaltadas, com água e esgoto, praça, creche, escola, posto de saúde, quadra de esportes e uma igreja. A prefeitura planeja formar uma cooperativa para fabricação de suco ou doce com frutas típicas, além de curral comunitário, um laticínio e tanques para peixes.


Enquanto as autoridades tentam fazer a desapropriação de terras, uma disputa política local põe em risco alguns planos do projeto sonhado pelo empresário Eike Batista. Cinco dos nove vereadores de São João da Barra aprovaram uma lei, estabelecendo a área do distrito industrial do Açu como de interesse social e ecológico.

Sob o efeito da lei, a região não pode ter sua geografia alterada, impedindo não só os empreendimentos do bilionário empresário como também dos moradores.


“A população está tendo a chance secular de vivenciar a transformação da pequena São João da Barra num grande polo industrial, comercial e off shore”, escreveu a prefeita Carla Machado, em seu pedido de veto à lei. Mas a Câmara o derrubou no início de dezembro.

Para a prefeitura, a lei aprovada é inconstitucional – feita por maioria simples, e não dois terços dos vereadores, além de ferir iniciativa do Executivo. “Vamos entrar na Procuradoria-Geral do Estado contestando”, avisa ela. “Não posso governar sem pensar no interesse coletivo, mesmo que isso venha afetar a alguns poucos.”

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